terça-feira, 9 de novembro de 2010

mostra: NEGA-AÇÃO

O CineRapadura Aproveita as discussões acerca da consciência negra.E traz a mostra "NEGA-AÇÃO".
A mostra do mês será realizada no Centro de Formação de Professores da UFRB em Amargosa (Sala 07-às 19:00)  e em um colégio da cidade,o Pedro Calmon.


A NEGA-AÇÃO PARA O NEGRO SER
Pensando uma NEGA-AÇÃO para constituição de um NEGRO SER evidenciamos uma pesquisa realizada em um escola pública municipal da cidade de Amargosa. Nessa pesquisa foi constatada uma visão simbólica no que se refere a representação de alunos e alunas sobre a definição do que é racismo.  As respostas mais frequentes se estruturavam pelas seguintes afirmações: a) o racismo é chamar de negro; b) o racismo é ofender de negro. Diante desse dado vale salietar algumas inquietações: chamar de negro configura o racismo? O fato de ser negro é uma ofensa?
Compreendemos o fato do processso de socialização do/a aluno/a negro/a perpassando por uma construção histórica,  como uma trajetória de constantes dificuldades e pouca valorização da sua identidade. Entretanto, não concordamos em aceitar a continuidade dessa realidade.
Essas inquietações nos remetem a necessidade de pensar uma NEGA-AÇÃO para desconstrução de equívocos e estereótipos relacionados à representação social do NEGRO edificados historicamente. O chamar de negro deve ser trabalhado como estrategia de mobilização, enfatizando a raça negra enquanto categoria política com valor e reconhecimento das lutas e conquistas perpetuadas por diversos movimentos de resistencia, sobretudo pensando a sua auto-afirmação. SOU NEGRO. 
No que tange ao ofender de negro, torna-se imprescindível a postura de enfretamento para favorecer atitudes e comportamentos representados em uma perspectiva de valorização na dinâmica histórica, cultural e política formativa desse ator social. A autoafirmação étnico-racial é vital nesse processo. A aceitação do SER NEGRO/A é um importante passo para a desconstrução do ofender de negro.
As lutas geraram vitórias relevantes dos movimentos de resistência negra, entretanto, é preocupante o imediatismo no que diz respeito ao debate do racismo e preconceito. Entendemos  que a consciência negra deve ser trabalhada no cotidiano, e não apenas no dia ou semana da consciência negra. Com efeito, ressaltamos que o mês de novembro seria um ápice de um trabalho realizado diariamente, principalmente com intuito de visibilizar e atribuir sentido à atuação do povo negro diante da sua história. Para tanto, relevamos a necessidade de uma NEGA-AÇÃO para constituição de um NEGRO SER.
Carlos Adriano da Silva Oliveira.
 Estudante do curso de Pedagogia/CFP e Professor do Colégio Estadual Pedro Calmon. Email: drieu15@yahoo.com.br





Sobre o trabalho realizado na Escola Estadual Pedro Calmon na cidade de Amargosa/BA

No trabalho realizado na Escola Estadual Pedro Calmon, a equipe do Cine Rapadura propôs à direção e professores a seleção de temas de interesse dos estudantes e que pudessem ser explortdos nos diferentes componentes curriculares. Segundo a direção da escola, houve aceitação por parte de todos e, assim, estabelecemos como meta a realização de Mostras entre os meses de Setembro e Novembro. Ao início do mês de Setembro entramos em contato com os professores para apresentar a equipe e informar os filmes que iríamos exibir na primeira Mostra, bem como socializar o cronograma de participação das turmas.
Na primeira exibição – Meninas, dirigido por Sandra Werneck, Mostra do mês de setembro – enfrentamos um problema que se estenderia durante os três meses de atividades na escola: a falta de comunicação e a não presença dos professores durante as exibições. Com a falta do professor e apesar da apresentação da equipe e dos propósitos do projeto a cada início de sessão, muitos estudantes reagiram à atividade como um momento de lazer e de fuga à formalidade, onde todos podiam entrar e sair a qualquer momento ou mesmo não participar. Houve situações em que uma professora nos disse que iria dispensar os estudantes que não tinham interesse em assistir o filme. Neste momento, tivemos que ser firmes e reforçar junto à professora os propósitos do projeto e esclarecer que aquela atividade era uma atividade educativa como qualquer outra da escola e que por isso a participação não tera de caráter  voluntário. 
Numa relação quase de causa e consequência, o não envolvimento dos professores resulta no não envolvimento dos alunos. 
Após o término do filme da primeira exibição – filme Meninas – uma boa parte de estudantes saiu e não voltou para o debate. Como essa situação se repetiu em outras salas durante nossa estada na escola, inferimos que possivelmente não é prática na escola oportunizar momentos de debate e troca de idéias. Outra situação que nos leva a esta reflexão é o fato de que durante as exibições, os estudantes, riam, faziam comentários, demonstravam diferentes reações de incômodo, alegria, raiva, mas, durante o debate, momento em que essas impressões poderiam ser verbalizadas, havia dificuldade para apresentá-las e discuti-las. Eles haviam sido tocados. Isto era evidente, mas sentíamos que faltava a prática do discurso, do “trocar idéias”, do falar de si, dos sentimentos, das impressões pessoais sobre os fatos da vida. Esses são atributos culturais em grande medida mediados, incentivados e cultivados pela escola e que, como os conteúdos das disciplinas, precisam ser constantemente trabalhados, motivados e valorizados para que se incorporem às condutas dos estudantes
Para Hannah Arendt,
“Ao agir e ao falar, os homens mostram quem são, revelam ativamente suas identidades pessoais e únicas, e assim fazem seu aparecimento no mundo humano, enquanto suas identidades físicas aparecem, sem qualquer atividade própria, na conformação singular do corpo e no som singular de sua voz.” (ARENDT, 2010: 224)
Essa revelação de si só faz sentido, segundo a autora, no âmbito público, uma vez que nosso senso de realidade depende totalmente da aparência e, portanto, da existência de um domínio público no qual as coisas possam emergir da treva de uma existência resguardada no âmbito privado (ARENDT, 2010: 63). Nesse sentido, “a presença de outros que vêem o que vemos e ouvem o que ouvimos garante-nos a realidade do mundo e de nós mesmos (...)” (ARENDT, 2010: 61).
Mais que simplesmente falar, era colocada para os estudantes nesse momento uma situação de elaboração de idéias, argumentos, de apresentação da singularidade. Assim, o espaço do debate de idéias apresenta-se como importante momento de apresentação de si, do reconhecimento da igualdade e da diversidade, de intercâmbio de experiências e da experiência comunicável

Na escola Pedro Calmon, a atuação do Cine Rapadura teve, além do papel decisivo de formação estética e ética dos sujeitos, colaborado para diagnosticar situações problema. Não apenas a Mostra Sexualidade no Cinema, mas as exibições e debates das Mostras Nega-Ação no Cinema e Violência e Desigualdade, trouxeram à baila diferentes questões, cujo aprofundamento e tratamento educativo se fazem necessários, seja por meio da formação de professores, seja por ações de intervenção junto aos estudantes. Mostram também, apesar de uma certa resistência, a importância e necessidade da utilização de produções cinematográficas dessa natureza na escola, uma vez que o debate que elas suscitam, está muitas vezes invisibilizado, mas não menos presente.

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